Além dos problemas de saúde e financeiros, a pandemia também prejudicou os relacionamentos interpessoais, por muitos fatores: perdas de pessoas, de saúde, perdas econômicas e muitas inseguranças. Atravessamos um ano de bloqueio, não só físico, mas também emocional.
A sexóloga e terapeuta de casais Esther Perel diz que os desastres e crises geralmente funcionam como aceleradores de relacionamentos: pode aumentar nosso senso de mortalidade, de precariedade, aquele senso de que a vida é curta. E quando a vida é curta, você pode dizer de repente: ‘Vamos morar juntos, vamos ter um filho, vamos nos casar, vamos nos separar’. Faz pensar em algo como: ‘O que estou esperando para fazer o que desejo?’
No atual momento é possível comparar as reações das pessoas com períodos de guerras: algumas pessoas lidaram amortecidas, com comportamentos muito vigilantes, experimentando a vida como uma questão de sobrevivência básica. Outros, no entanto, tinham um gosto incrível por conversa, música, dança, amor, sexo. Estes entenderam a “energia da vida como um antídoto para a morte”. Sendo assim, não apenas reconstruíram suas vidas depois da guerra, mas também, de certa forma, prosperaram. Não é negação do problema, ou da tristeza, mas escolher de qual forma vai conduzir a vida, mesmo com o problema, ainda com a tristeza.
Ao pensar sobre a forma de conduzir a vida diante desta pandemia, leva-se em conta o profundo desespero que muitas pessoas sentiram durante o confinamento. Há lutos que não tiveram seu espaço de lamento e despedida, houve perdas econômicas graves, inseguranças e sofrimento pelas mudanças necessárias. Esses lutos também precisam ser compartilhados, para a dor, ao ser dividida, ficar menos doída.
Em relação ao trabalho, para as pessoas que puderam trabalhar em casa, isso não significou apenas uma perda completa de limites, significou uma perda das rotinas que costumavam definir nossas vidas. A rotina pré-pandemia determinava: “Eu me visto para ir trabalhar. Eu me desloco para o trabalho. Eu saúdo o porteiro. Pego meu café. Eu entro no escritório. Digo olá para pessoas e vou iniciar minha tarefa.” Esses são comportamentos ritualizados que indicam que entramos no local de trabalho e que uma parte diferente de nossa identidade está surgindo.
Ao trabalhar em casa, houve perda de limites e estrutura: muitas pessoas sentem como se todas as suas identidades tivessem se transformado em uma: “Eu sou uma mãe/pai, sou uma esposa/marido, sou uma amante, sou uma amiga/amigo, sou uma filha/filho, sou o gerente, sou o repórter, sou dona/dono de casa, sou, sou…” Tudo acontecendo em uma cadeira na mesma mesa da cozinha ou do quarto, do ‘home office’. A vida profissional anterior à COVID vinha com normas, regras e obrigações, e perdemos essas demarcações, fato que auxilia a nos deixar tão exaustos.
E aqui também há a possibilidade de escolher como lidar, pois estar/ficar em casa abre a possibilidade de ter experiências que há muito não se tinha, de interagir mais com os filhos, com o(a) parceiro(a), de criar momentos gostosos, de conversar, ouvir música, dançar, fazer sexo…
À medida que mais e mais pessoas vão sendo vacinadas, vai intensificando o desejo de se reconectar com aspectos da vida, num sentido de abertura, curiosidade, alívio. Mais cedo ou mais tarde as festas vão recomeçar, os encontros vão acontecer de novo, o trabalho retomará seu espaço presencial, etc. As pessoas vão retomar, como fizeram depois de todas as guerras e depois de todas as outras pandemias. E só o tempo dirá quais marcas ficaram para cada um de nós…
Diante disso, o mais importante, antes durante e após a pandemia é: a conexão entre as pessoas. Os seres humanos, onde quer que estejam, procuram se conectar com alguém que os ajudará a se sentirem menos sozinhos em sua experiência, este caminho é essencial para termos a energia de vida como um antídoto para a morte. Independentemente da pandemia, que a vida que se tenha, pelo período que se tenha, valha a pena ser vivida.