Recesso de Natal, Ano Novo e quem sabe férias. Ufa! Chegamos a mais um final de ano. Tempo de dar pausa na rotina, esquecer dos compromissos, desopilar e renovar as energias para mais um ciclo que recomeça. Simples assim? Nem tanto. Aproveitar e relaxar na praia pode ser um desafio para muitos. O verão nos deixa mais expostos a fazer contato com nosso corpo, seja pelo calor, pelo foco retirado do trabalho, pelas comparações que o contato com amigos e familiares pode gerar, etc… E é a relação que estabelecemos com nosso corpo que faz toda diferença. O conceito de imagem corporal envolve padrões de pensamento, atitudes, emoções e diferentes comportamentos. É como uma fotografia mental que construímos de nós mesmos. Às vezes essa fotografia pode estar atualizada e coerente com a realidade, outras vezes não.
Muitos estudos têm apontado a forma negativa como, principalmente as mulheres, têm experimentado seu corpo. Uma recente comparação entre estudantes brasileiras, argentinas e americanas, mostrou que quase 80% das mulheres apresentava insatisfação em relação a imagem corporal, e que as brasileiras tiveram os maiores índices de vergonha do corpo. Ainda que menos estudado, o gênero masculino também experimenta descontentamento com seu corpo. Diferentemente das mulheres, cujo ideal de beleza consiste em tornar-se magra, o foco dos homens está em aumentar sua massa muscular e tornar-se mais forte. Dentre as consequências relacionadas à insatisfação da imagem corporal destacam-se o risco aumentado para o desenvolvimento de transtornos alimentares e inúmeros comportamentos não saudáveis em relação ao peso, como a realização de dietas restritivas; compulsão alimentar; baixos níveis de atividade física, entre outros.
Sabemos também que a imagem corporal é fortemente afetada pelos ideais de beleza em cada sociedade; pelos padrões transmitidos pela mídia e pela maneira como nos percebemos aceitos em relação ao nosso corpo, principalmente no contexto familiar. Ainda que o impacto cultural seja experienciado por todos, a forma como cada pessoa vai desenvolver sua relação com o corpo é singular. A flexibilidade da imagem corporal, conceito advindo da ACT (Terapia de Aceitação e Compromisso), é descrita como a habilidade de experienciar eventos internos difíceis em relação ao corpo, tais como percepções, sensações físicas, sentimentos, memórias e pensamentos, sem que isso desencadeie julgamentos ou defesas.
É como notar o incômodo com a própria barriga, e ir confraternizar com amigos ao invés de ficar em casa para escondê-la, por exemplo. Ou ao interagir com alguém, notar a mente presa em como acho que estou sendo observado pelo outro e poder optar em direcionar a atenção ao assunto conversado. O ponto aqui consiste em não perder a capacidade de desfrutar das coisas importantes na tentativa de fuga de sensações desconfortáveis.
A ACT também nos brinda com o conceito de aceitação, o qual enfatiza a possibilidade de fazer contato com a experiência interna da forma em que ela se apresenta, sem precisar lutar, controlar, ou fugir de tais sensações. Aceitar o próprio corpo não significa amar cada parte dele ou estar plenamente satisfeito. De fato, estarmos descontentes com nosso corpo não necessariamente é o problema, mas a busca em tentar “resolver esse problema” pode ser. Em recente entrevista, a cantora Anita comentou sobre a luta que travou contra a celulite, entrando num processo de “nunca fica bom”, o qual resultou em uma desmotivação e apatia geral com a vida.
É comum também ouvirmos frases como “quando estiver me sentindo melhor com o meu corpo, vou à praia”. Essas promessas futuras podem facilmente nos enganar e nos manter presos a velhos padrões comportamentais. Da mesma forma, trazendo o passado à tona, podemos nos deparar com fotos antigas e nos acharmos muito bem e depois lembrar: “naquela época eu me sentia desajeitado/muito magro/muito gordo feio/estranho/etc”. Assim, é importante lembrar que o processo de aceitação faz parte do presente, da abertura momento a momento ao que gostamos e não gostamos, da possibilidade de reinventar nossas próprias escolhas.
A aceitação também não significa tampouco deixar de investir em mudanças!! Existe uma ideia de senso comum de que aceitar significa resignar-se, quase como um abatimento pela desesperança. Esse não é o conceito que trazemos aqui! Se permitir notar o desconforto de forma compassiva, sem se deixar levar em meio à críticas e julgamentos, pode inclusive facilitar o processo de motivação para fazer diferente.
Portanto, se você tem corpo, então está com corpo de praia. Permita-se sentir o vento bater na pele e com ele solte seus julgamentos; leve a vergonha para passear nas areias, pegue onda com as ideias mais rígidas e incômodas sobre os milhões de “deverias”; desfrute dos pequenos prazeres; acolha seu desconforto como fazemos com uma criança que enche os próprios olhos de areia; exercite a gratidão por tudo que funciona perfeitamente; pelas possibilidades existentes dia-a-dia. Afinal de contas, temos apenas um corpo para aprender com tudo isso. Viva-o.