Psicoterapia e o processo de desfusão com adolescentes

A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) é uma abordagem de compreensão do funcionamento humano e intervenção psicológica. O objetivo central das intervenções é gerar flexibilidade psicológica a partir da aplicação de processos de aceitação e processos de mudança do comportamento.

A desfusão é o processo utilizado pela abordagem para diminuir a conexão entre o conteúdo verbal dos pensamentos e o comportamento. A mente continuamente está avaliando, comparando, prevendo e planejando. Quando os indivíduos estão em processos analíticos verbais muito intensos, eles se conectam com as relações das análises e se distanciam da experiência do presente.

A desfusão tem como objetivo fazer contato com os eventos verbais como eles são, interpretando os pensamentos de forma não literal, apenas como pensamentos. O significado verbal não é eliminado, apenas há a redução de seu
efeito automático no comportamento, para que outras informações possam influenciar o comportamento. Desse modo, o terapeuta auxilia o cliente a observar o que mais a sua mente tem a dizer.

Para o trabalho com adolescentes, Louise Hayes (2015) propõe um modelo que é denominado DNA-V. Nesse modelo, ocorre a divisão dos processos da ACT em três classes funcionais de comportamento com nomes metafóricos: descobridor, observador e conselheiro. Essas três classes estão a serviço dos valores e são influenciados pelo contexto que o adolescente vive: as influências históricas, o ambiente imediato e a percepção dele mesmo e dos
outros.

No modelo DNA-V, a metáfora utilizada para trabalhar a ideia de como as pessoas utilizam a linguagem e cognição é o ‘conselheiro’. A palavra ‘conselheiro’ permite falar do conteúdo verbal tomando uma perspectiva distanciada, onde ‘os pensamentos estão ali e eu estou aqui’.

O desenvolvimento da linguagem, ou o ‘conselheiro’, traz aspectos positivos para os seres humanos tais como evitar os perigos da tentativa e erro, utilizando as experiências do passado para analisar a situação presente, protegendo o indivíduo do perigo. Ela promove a evolução em alta velocidade e rápidos avanços científicos e tecnológicos. As palavras ajudam a aprender rapidamente e fazer escolhas no mundo com alto grau de eficiência e fornecem regras úteis sobre nosso contexto e relações. As conversas internas também são utilizadas para formar crenças e avaliar a si próprio. Pode-se utilizar a história de aprendizagem para fornecer conselhos sem precisar entrar em contato direto com a experiência.

Porém, o ‘conselheiro’ pode levar o indivíduo a seguir ideias rígidas que não estão atualizadas ao momento presente. Pode também absorver ideias desnecessárias dos outros, como conselhos e opiniões. E às vezes as mesmas regras são aplicadas em contextos muito variados. Os pensamentos também podem distorcer informações recebidas, fazendo associações ou avaliações com diversas outras informações. Quando a vida está muito difícil de aceitar, a tendência é que o foco de atenção fique rígido aos pensamentos.

Os pensamentos que os adolescentes trazem ao início da terapia podem parecer superficiais, como preocupações cotidianas relacionadas a escola, amizades ou família. O terapeuta precisa estar atento e acolher o que o adolescente traz, sem tentar consertá-lo ou entrar em um debate com essas ideias.

O conteúdo dos pensamentos não são o foco do tratamento e sim a forma que os adolescentes se relacionam com eles. Quando ocorre o distanciamento do processo de pensamento, é possível dar atenção às informações que estão presentes no mundo e assim fazer as mudanças necessárias no contexto em que vivem.

 

Referências:

HAYES, L. L.; CIARROCHI, J. C. The Thriving Adolescent: Using Acceptance and Commitment Therapy and Positive Psychology to Help Teens Manage Emotions, Acheve Goal, anda Build Connection. Oakland, CA: Context
Press, 2015.

TURRELL, S. L.; BELL, M. ACT for Adolescents: treating teens and adolescents in individual and group therapy. Oakland, CA: Context Press, 2016.

HAYES, Steven C.; STROSAHL, Kirk D.; WILSON, Kelly G. Terapia de Aceitação e Compromisso: o processo e a prática da mudança consciente. Tradução de Sandra Maria Mallmann da Rosa. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2021.

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Sobre o Autor
Ana Paula Domeneghini
Psicóloga (PUCRS - CRP 07/23571). Especialista em Terapias Comportamentais Contextuais Baseadas em Processos (CEFI). Especialista em Terapia Sistêmica Individual, Conjugal e Familiar (CEFI). Atua como psicóloga clínica com atendimento individual, familiar e conjugal. Membro da Equipe CEFI Contextus. ver mais

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