INFIDELIDADE E O DIFÍCIL -E POSSÍVEL- RESGATE DA CONFIANÇA

INFIDELIDADE E O DIFÍCIL -E POSSÍVEL- RESGATE DA CONFIANÇA

 

A verdade é inimiga da infidelidade.
Hsing Yün

O que é infidelidade? Geralmente é a quebra de um contrato pré-estabelecido, o descumprimento de uma combinação da relação conjugal. Vale lembrar que, ao falar sobre relacionamentos conjugais, sabemos que ambos parceiros contribuem para um conflito, mesmo sendo de forma não intencional. Poderíamos conversar mais sobre as definições e conceitos históricos e culturais sobre a infidelidade, mas aqui vamos focar no conceito que se refere à violação de regras estabelecidas num relacionamento conjugal.

A maioria das relações conjugais tem a monogamia como algo fundamental, e é por isso que ter relações sexuais com outra pessoa é considerado infidelidade, traição de uma confiança que pode levar a uma grande mentira. Até mesmo nos relacionamentos que permitem ter relações sexuais com outras pessoas pode ocorrer a infidelidade, pois dependerá do contrato inicial do casal. Por exemplo, há casais que permitem relações sexuais com outros, desde que não seja com amigos, ou desde que seja uma única vez, ou desde que não se apaixone… A questão é quebrar as regras combinadas.

Outro aspecto importante é que a infidelidade pode ir além de um contato sexual com outra pessoa, por exemplo, a parceira passou a conversar, a falar de sua intimidade com outra pessoa, afastando-se do parceiro atual, tornando-se confidente desta outra pessoa. O resultado pode ser afastamento do casal. Os autores da IBCT (Terapia Comportamental Integrativa de Casal – Integrative Behavioral Couples Therapy) chamam esta situação de ‘adultério do coração’. Podemos questionar se, na atualidade, não estão acontecendo muitos ‘adultérios do coração’?

Em uma pesquisa norte americana sobre o comportamento sexual humano, cerca de 20% das mulheres e 25% dos homens indicaram que haviam sido sexualmente infiéis em seus casamentos. Entretanto, uma pesquisa britânica com uma definição expandida de infidelidade que incluía “adultérios do coração” revelou que 40% dos participantes eram infiéis (Jacobson, Christensen & Doss, 2014, p.299).

Para sabermos se determinada situação é ou não infidelidade, Pittman (1987) renomado terapeuta de casal, propõe a seguinte questão: se você não tem certeza se determinado comportamento é traição ou não, é simples descobrir: pergunte ao seu parceiro/a se seria ou não. A melhor pessoa para lhe dar a resposta é quem está envolvido, por direito, na situação.

Ter um caso extraconjugal impacta na relação porque as farsas abrem espaço para desconfiança. O funcionamento pode se polarizar em perseguidor (traído) e distanciador (infiel), a comunicação pode ficar totalmente disfuncional pelas mentiras e segredos, além da intimidade da relação ser dividida com uma terceira pessoa. As emoções de tristeza, medo e raiva podem afetar todo contato entre os parceiros e as formas de se relacionar podem ficar insuportáveis.

Mas o fato de ter um caso não justifica, necessariamente, uma separação. É uma crise que pode auxiliar um casamento já deteriorado a se definir pelo fim da relação, como também pode ser uma oportunidade para o casal se rever e tentar, se assim desejar, uma forma de vida conjugal mais satisfatória. Todavia, pode ser uma jornada difícil, visto que as formas mais reativas de tentar resolver a questão podem criar problemas adicionais, verdadeiras armadilhas. Por exemplo, quem foi infiel pode ter medo de contar o que aconteceu e se distanciar ainda mais, enquanto que quem foi traído pode estar com tanta raiva que se sente autorizado a acusar e invadir a vida do outro.

Um dos principais aspectos a ser resgatado é a questão da confiança: quem foi traído pode querer provas da fidelidade e quem traiu pode se irritar com tanta suspeita e vigilância. Christensen e colaboradores (2014) trazem que o que mais importa é a experiência que o casal tem enquanto está junto, e não o que cada um faz quando não estão presentes. Se o sentimento de culpa ou arrependimento é genuíno, percebe-se que há afeto pelo cônjuge, que há senso de integridade. Se há empatia com a dor do que foi traído, pode-se entender que não haverá desejo de machucar novamente. Quanto mais esforços para aberturas, maior chance para a intimidade e menos pontos desconhecidos. Desse modo, há mais abertura para poderem falar o que sentem e pensam, sem fúrias acusatórias, num processo que necessita da participação dos dois. O objetivo será o equilíbrio entre intimidade e confidencialidade.

E, se for preciso, a terapia de casal pode auxiliar neste processo de resgate, perdão e redescobertas com cada um dos parceiros sendo, ou buscando ser a pessoa que realmente quer ser na relação conjugal.

 

Referências

Christensen, A., Doss, B. & Jacobson, N. (2014). Reconciliable Differences: Rebuild your relationship by rediscovering you love – without losing yourself. New Yor: The Guilford Press. Second Edition.

Pittman, F. (1984). Mentiras Privadas. Porto Alegre: Artes Médicas.

 

 

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Sobre o Autor
Mara Lins
CRP 07/05966 Psicóloga. Doutora em Psicologia Clínica (UNISINOS). Mestre em Psicologia Social (PUCRS). Especialista em Terapia de Casal e Família (CEFI). Treinamento em Terapias Comportamentais Contextuais. Treinamento em Terapia Comportamental Integrativa de Casal (Integrative Behavioral Couple Therapy-IBCT) com Andrew Christensen e sua equipe. Professora e Supervisora de cursos de pós-grad... ver mais

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