Como bons indivíduos formados por corpo e mente, a avaliação dos sintomas psíquicos num primeiro atendimento deve ter uma investigação criteriosa e bastante acurada para discriminar com melhor exatidão o que de fato acomete o paciente.
Nossos organismos são formados por uma coleção de sistemas que se interligam e funcionam de forma ordenada para manter o equilíbrio que permite a nossa vida.
Desta forma, é impossível separar a avaliação clínica da avaliação das funções mentais de um indivíduo num atendimento psiquiátrico, e uma boa anamnese dá-se quando uma entrevista minuciosa ocorre com o intuito de avaliar o paciente integralmente e como um organismo completo.
Os sintomas psíquicos podem ter relação com alterações da nossa mente e também podem estar associados a modificações clínicas, que podem agravar ou precipitar as alterações mentais.
Anemia, alterações de função tireoidiana e outras alterações hormonais, deficiências vitamínicas, alterações de perfil lipídico podem cursar com: fraqueza, cansaço, dor articular, pensamento mais lentificado e também acelerado, ansiedade, desmotivação, dificuldade de concentração, entre outros sintomas. Se um paciente chega para avaliação com dor no peito, por mais que a anamnese indique perfeitamente que o sintoma clínico decorre de um quadro ansioso, temos que excluir causa orgânica, então, diante deste sintoma, são lançadas algumas hipóteses:
- o paciente está ansioso e a ansiedade provoca o sintoma clínico, aparecendo, então, como uma dor no peito;
- o paciente está ansioso, a ansiedade pode piorar o sintoma clínico, aparecendo a dor no peito, podendo esta estar associada à cardiopatia (angina);
- o paciente é cardiopata e também está apresentando sintomas de ansiedade.
Viram como os sintomas mentais e clínicos podem acabar por se interligar? Vamos a mais um exemplo: um paciente chega para atendimento com sintomas que são característicos de uma síndrome depressiva: cansaço, diminuição de apetite e desmotivação. Lançam-se então as hipóteses na entrevista de avaliação:
- cansaço e fraqueza (podendo ser decorrentes de uma enfermidade clínica, como anemia) -> diminuição de apetite -> desmotivação;
- desmotivação (podendo ser decorrente de uma enfermidade psíquica, como depressão) -> diminuição de apetite -> cansaço e fraqueza;
- diminuição de apetite (podendo ser decorrente de uma enfermidade clínica e/ou psíquica) -> cansaço e fraqueza -> desmotivação.
Para maior compreensão do indivíduo como um organismo complexo e formado por múltiplos sistemas conectados, temos, enquanto profissionais, que avaliar este indivíduo em sua completude, ou seja, para maior clareza e acurácia em uma avaliação psiquiátrica, muitas vezes, faz-se necessária a solicitação de exames laboratoriais, tais como: hemograma, função hepática e renal, perfil lipídico, perfil tireoidiano e hormonal em geral, vitaminas, eletrólitos. Algumas vezes também é necessário solicitar eletrocardiograma, eletroencefalograma, tomografia de crânio, entre outros. Também é indicado, frente a comorbidades clínicas, encaminhar o paciente para avaliação com o cardiologista, endocrinologista, neurologista, entre outros encaminhamentos que são realizados.
Diante de um paciente em uma avaliação psiquiátrica, o profissional deve olhar este indivíduo numa completude geral para discriminar melhor os sintomas e possibilitar então um tratamento mais indicado e acurado. Uma anamnese rica facilita a compreensão do profissional e o entendimento de forma mais verossímil dos sintomas que acometem o paciente. Enquanto profissional da saúde, o psiquiatra deve funcionar como um prisma, promovendo a refração do indivíduo (luz) em todos os sintomas/comorbidades (cores) para o melhor entendimento deste indivíduo, possibilitando, com isso, um tratamento mais adequado e de mais sucesso.