De braços abertos, eu me vejo

Há vários anos já não tenho mais o hábito de assistir televisão, tão pouco ver filmes e séries no adorado Netflix. Mas recentemente resolvi verificar o que tinha por lá e encontrei um título que me chamou atenção: Embrace. Um documentário de 2016 da ativista Tatyn Brumfitt, que quebra paradigmas sobre imagem corporal. O tema do filme me interessou, pois de alguns anos para cá, venho trabalhando e estudando bastante sobre comportamento alimentar, obesidade, imagem corporal – inclusive esta não é a primeira vez que escrevo sobre este tema aqui. Ao longo desse período, a relação com o corpo e com a alimentação é uma demanda comum entre quase todas as mulheres que já acompanhei, inclusive para mim mesma.

Tenho algumas alergias alimentares, que me levaram a desenvolver maior cuidado com o que eu comia, e com o passar dos anos, os obstáculos que eu enfrentava foram precursoras para minha motivação em auxiliar outras pessoas a desenvolverem uma alimentação mais consciente. Posso dizer que minhas próprias dificuldades com a alimentação foram o fomento para meu interesse em trabalhar com isso.

E meu objetivo hoje é apenas compartilhar minha experiência enquanto pessoa e fazer uma forte recomendação para que assistam esse documentário, pois enquanto eu o assistia, fui me dando conta de coisas que têm muita importância para mim.

Neste meu trabalho como psicóloga em parceria com nutricionistas, fui encontrando outras mulheres – especialmente mulheres – com problemas alimentares, e percebi que o que mais me conectava a elas era a autocrítica em relação ao meu próprio corpo, e não tanto a necessidade de restrição alimentar. Qual mulher está plenamente satisfeita com sua imagem? Penso que aprendemos desde muito cedo a não estar.

Eu fui uma criança bem bonitinha. Tinha um sorriso cativante e com muita frequência recebia elogios dos adultos referentes a minha imagem. Eu detestava isso. Sentia muita vergonha, me sentia intimidada ou pensava que isso era o que mais valorizavam em mim. Era muito difícil aceitar como eu era, pois não queria chamar atenção, e até tentava piorar minha aparência bagunçando meus cabelos para ver se desviava a atenção.

O problema se deu quando eu mesma acreditei que a imagem era o mais importante e que eu me via distante de como pensava que deveria ser. Eu não tinha as roupas que queria, era muito mais baixa que minhas amigas e minhas bochechas eram fofas demais. É fácil fazer uma lista crítica apontado os “defeitos” que temos. Até uma orelha diferente eu carinhasamente dizia ter vindo com “defeito de fábrica”.  E vejo que não sou só eu que sabe bem fazer isso. Mulheres de tudo o que é canto do mundo o sabem, e me emocionei em vê-las na minha televisão.

Vi que eu compartilhava com elas -que expuseram suas hirtórias no documentário – tanto a insatisfação quanto o caminho que encontramos para lidar com isso. O filme fala muito sobre aceitar o próprio corpo, acolhê-lo da forma como ele é. É lindo isso, necessário eu diria. Entretanto, acho pertinente expressar minha opinião sobre que aceitação é essa, que tem a ver com o que aprendi com a Terapia de Aceitação e Compromisso.

Aceitar o corpo é em parte aceitar a própria humanidade. É se deparar com as dores mais difíceis, com as falhas, com os medos e pensamentos mais absurdos. É reconhecer que isso faz parte de você, que mesmo que não queira, estarão ali e que provavelmente já lhe acompanham há muito tempo. Isso não quer dizer que não pode mudar. Ao aceitar, não significa que assinará um contrato no qual a mudança é proibida. Temos a liberdade de querer mudar. Talvez seja útil se perguntar: para quê mudar? Para não sentir e ver o que faz parte de si ou para ser quem você quer ser?

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Sobre o Autor
Maria Eduarda D. de Alencastro

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