Em Busca de Rotas Alternativas

Quando eu saio de casa e toca uma música que eu gosto, acontece o seguinte: paro na escola dos meus filhos querendo ir para o consultório (digo, parava, em outra época kkk), no consultório tentando ir pra casa… São respostas automáticas, as quais nos ajudam imensamente a economizar energia e tocar a vida da forma que precisamos. Por isso gosto e faço uso de um bom GPS. Além das minhas óbvias dificuldades de localização geográfica e espacial, ele me parece bem efetivo na tarefa de facilitar o dia-a-dia, me levar ao destino de forma despreocupada e me manter no fluxo necessário.

Contudo, essa facilidade nem sempre é / foi útil e efetiva. Se estou disposta a explorar com curiosidade minha rota; me arriscar em um novo trajeto; experimentar se aquela linha vermelha na tela realmente está congestionada na realidade ou simplesmente deixar um pouco de lado o horário da chegada e curtir o caminho, o tal GPS não me ajuda.

Conforme a ciência comportamental contextual nos ensina, os “para quês” da vida fazem toda a diferença. Pensar naefetividade de um comportamento exige pensar no seu contexto, na função que esse comportamento assume.  E, assim, muitas vezes, a resposta automática não é a mais efetiva em dado contexto. É aí que entra a possibilidade de observar, de notar todas as variáveis que estão influenciando as minhas ações e de finalmente escolher o que fazer. Para mim, este é o mais perto de liberdade que podemos chegar.

Contudo, apenas saber que estamos em nosso “piloto automático” não garante nenhum desvio de rota. Notar que estamos no automático é uma parcela importante dessa escolha. Antever que certos comportamentos são mais fáceis de acontecer do que outros também (por exemplo, minha distração ouvindo música é algo bastante previsível kkk ) assim como tratar-se com gentileza frente a uma frustração, lembrando que sempre há uma próxima vez para tentar de novo. Na verdade, todos são passos importantes na escolha e manutenção de nossos padrões comportamentais.

Mudar de rota, mesmo quando desejamos, pode ser uma tarefa mais difícil do que parece. Meu filho de 4 anos, no alto da sua sabedoria, me disse certa vez: “Mãe, tu sempre vai igual pra escola”, referindo-se ao trajeto que fazíamos ao destino. E ele está certo, costumo ir da mesma forma pra escola e pra tantos outros locais. Sigo indo no supermercado que costumava ir antes de me mudar, mesmo com os milhares de “prejuízos” que tenho ao manter essa escolha. Dentre inúmeros outros aspectos, acho que tenho em mim que esse “é o meu super”, o que mais me sinto em casa, o que eu sei exatamente o que esperar. Parece bobo, chego a rir agora, mas é verdade.

Mudar os comportamentos que estamos acostumados, mesmo sabendo que os resultados (ou os processos) não são os melhores é algo especialmente difícil. Me encontro, na vida, na fase final do mestrado. Me preparei para esse momento, há tempos. Criei coragem e arrisquei. Passei. Planejei para levar minha vida de forma equilibrada e possível e acho que venho fazendo um bom trabalho nessa direção. Mas nesse momento, no qual me encontro muito cansada (o que é completamente esperado, eu sei!) me vejo recorrendo aos velhos comportamentos: não delegar outras tarefas que tenho, não parar para descansar, correr ao máximo para terminar e me ver “livre”. Reconheço que aprendi desde muito pequena que “esforço” tem uma associação positiva (cacoete da escrita científica hehe) com “sofrimento” e sigo repetindo esses padrões quando entro no meu piloto automático.  Noto medo de fazer diferente, vergonha de assumir pra mim mesma que repito o que condeno, culpa de como ficarão as pessoas que estão envolvidas comigo nos outros diversos trajetos dessa vida…E só de pensar nisso, me noto triste, desencorajada a fazer diferente.

Mas realmente quero um novo percurso. Uma viagem planejada com tanto carinho não precisa ser lembrada apenas pelo sabor amargo do final, há que se tentar de outras formas. Quero construir novas associações! Desenvolver novos aprendizados, os quais não serão a “solução mágica” para nada, mas podem ser melhores guias de viagem, quem sabe.

Na mente, a mudança costuma ser bem-vinda no tempo futuro. “Deixa eu só fazer o que eu já aprendi a fazer, e na próxima vez eu faço diferente”. E como é convincente! Chego a titubear nas minhas decisões apenas de escrever isso. 

E daí eu lembro que não necessitamos realmente dos GPSs, que inclusive calculam muitas vezes errado, diga-se de passagem. Temos o nosso próprio GPS interno. Podemos nos sintonizar com o que ele nos diz, retomar o propósito, prestar atenção no percurso e não apenas no destino final. Caminhar junto com todas essas emoções e ideias da nossa cabeça. Apenas pequenos passos

E finalizo esse texto-desabafo, trazendo a importância dos refúgios na estrada, aqueles que nos permitem parar para limpar a erva que derramou ou aliviar alguém de um desejo gigante de fazer pipi. No meu caso, agradeço as minhas relações-refúgios. Conversas sinceras, feedbacks necessários, ajuda real, outros pontos de vista. Momentos estruturados, como terapia ou supervisão, até uma singela conversa de whats, cheia de potência. Pessoas que gentilmente nos sinalizam que existe uma variedade de repertórios disponíveis que podem ser desenvolvidos frente às MESMAS E VELHAS SOLUÇÕES. Deixo aqui o meu mais sincero obrigada aos meus refúgios. Relações cuidadosas que podem nos trazer o melhor, sem apontar ou pressupor uma direção única a ser seguida.

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Sobre o Autor
Gabriela Damasceno

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