Quando eu menciono “tolerância”, não estou falando de como aprender a tolerar atrocidade pura. Refiro-me a aprender como acomodar sua vida da forma mais generosa possível em torno de um ser humano basicamente decente que pode, algumas vezes, ser um “pé no saco” (Elizabeth Gilbert, 2011).
De modo geral, não gostamos de sentir mal-estar, seja com alguma emoção entendida como negativa ou por pensamentos avaliados como ruins. Frente a experiências internas desagradáveis, nossa ação automática é voltada para eliminar estes eventos privados que nos fazem sofrer. Mesmo que a dor seja interna, atribuímos a causas externas a raiz de nossos problemas ou achamos que o problema não está em nós. Na relação de casal, quando isto acontece (e como acontece!), o impulso frente à dor é de eliminar o que julgamos ser o responsável por nossos problemas. Como? Mudando o(a) parceiro(a), claro!
Infelizmente, não é tão simples assim… As tentativas de esquiva podem ser no sentido de tentar controlar o outro, como por exemplo, criticando-o, discutindo de forma intensa, ou, inclusive, coagindo com silêncios ‘mortíferos’… As consequências, geralmente, não vão em direção a uma mudança genuína e perene. Pode até acontecer do(a) parceiro(a) mudar seu comportamento, mas, geralmente, o comportamento antigo, entendido como gerador do sofrimento, retorna… Afinal, numa relação conjugal mais duradoura, quantas vezes o casal tem a ‘mesma velha briga’? Se os comportamentos de coerção, ameaças ou briga ajudassem a mudar o comportamento do outro, todos os problemas estariam resolvidos…
Outro aspecto para observarmos é o número de vezes que nossos parceiros se queixaram de comportamentos nossos, e a crítica também volta, ou seja, assim como eles, não mudamos tão facilmente, ou queremos a mudança que nosso cônjuge deseja para nós… O principal ponto é que, salvo situações de violência (física, verbal, emocional, sexual), há e haverá diversos eventos que, gostemos ou não, irão acontecer no dia-a-dia da relação conjugal. Episódios que podem evocar todo mal-estar que não desejamos sentir e, mesmo assim, teremos de lidar com isso. Faz parte da existência lidar com o sofrimento, inclusive indo de encontro com a expectativa contemporânea de que as relações conjugais devem ser muito felizes. Esta ideia de ter de ser feliz pode piorar a questão de lidar com a dor.
Sendo assim, se há desejo de manter a relação, uma forma de aceitação seria aumentar a tolerância em relação a determinados comportamentos do outro. Como? Parando com os esforços frenéticos para mudar o(a) parceiro(a). Estes esforços podem ser mais destrutivos que a situação em si. A Terapia Comportamental Integrativa de Casal (Integrative Behavioral Couple Therapy – IBCT) sugere que, se os parceiros experimentarem o comportamento do outro sem lutar, podem acontecer mudanças de contexto e/ou diminuir a toxicidade e a situação é capaz de ser mais tolerável. Podemos fazer uma analogia com quem sofre com fobia de alguma situação específica. No tratamento, ao se expor gradualmente à situação, a carga emocional vai diminuindo. O ponto não é achar agradável o comportamento negativo do outro, mas evitar consequências catastróficas decorrentes de um padrão de relação destrutivo.
Por fim, ao se ter clareza de que as relações não têm a ver com felicidade, mas com todas questões, emoções, problemas que fazem parte da vida. Isto representa que vamos sentir ansiedade, dor, tristeza, raiva e medo. E vamos sentir alegria, segurança, prazer e amor. Aprender a tolerar o que antes era intolerável é uma grande conquista para o casal, como aprender a vida na sua plenitude.