ESTRATÉGIAS PARA LIDAR COM A RAIVA NA RELAÇÃO CONJUGAL

 

Lidar com as emoções num momento de conflito entre o casal, principalmente com a raiva, é algo bem mais complicado do que muita gente imagina. Por vezes, parte do problema é a forma como falamos e não, necessariamente, o conteúdo ou o problema a ser resolvido. Acrescentam-se a isso os processos biológicos do nosso cérebro que também influenciam. Também afeta o grau em que somos conscientes de nossas emoções, as definimos e como as expressamos.

É comum que, quando nosso sistema emocional se desregula, interfira diretamente na compreensão dos fatos e em outras funções de autocontrole. Os comportamentos podem ser mais intensos, como por exemplo uma conduta auto lesiva ou agressão ao parceiro(a), ou menos destrutivos, mas não menos causadores de sofrimento, como a agressão verbal.

Se a intenção é interromper e mudar esta forma de lidar com as emoções e situações difíceis, a Terapia Comportamental Integrativa de Casal (Integrative Behavioral Couple Therapy – IBCT) propõe diversas técnicas, tanto as de aceitação, quanto as de mudança. Veremos a seguir algumas estratégias de mudança:

  • Se você quer mudar algo no outro, mude a si mesmo:

Tão simples e tão complexo. A parte difícil é porque, geralmente, tentamos mudar o que está errado no OUTRO. Porém, uma mudança fundamental é quando nos concentramos em mudanças que estejam nas nossas mãos. Isto não significa que somos culpados pela situação, mas que só temos o controle e responsabilidade sobre o nosso comportamento, assim como o parceiro(a) só tem controle sobre o próprio comportamento. De certa forma, pode trazer alívio e a sensação de liberdade saber que não precisamos esperar, frustrados, pela iniciativa do outro(a). Uma tradicional armadilha que leva ao fracasso das relações é ficar preso num padrão de reclamar, criticar, invalidar o parceiro(a) e não fazer nenhuma ação construtiva para mudança. Pequenas atitudes de afeto e considerações podem aliviar a raiva e ressentimentos. Sabemos que não é tão simples fazer, mas é efetivo.

  • Falar ou não, eis a questão:

Por vezes as pessoas escolhem não falar do problema para evitar problemas… o que acontece? Alimenta o problema… a intenção é proteger a relação, evitar mais brigas que poderiam surgir ao tocar no tema. Porém a consequência é pior. Somente pelo fato do conflito se repetir uma e outra vez já justifica que falar sobre ele pode ser muito melhor que a dita ‘proteção’ ou sua evitação.

  • Minimizar as possibilidades de danos de uma discussão:

Inevitavelmente nossos parceiros(as) farão coisas que irão nos decepcionar, magoar, irritar. E nós a eles(as). Também há questões que nos agradam e alegram. A dor faz parte de toda relação. Uma tentativa de minimizar os danos de uma discussão é mudar suas circunstâncias. Por exemplo, expor suas ideias num momento em que ambos estejam calmos, falar por telefone, buscar um local seguro para falar, onde cada um toleraria mais o mal-estar do que em casa, como num local público. A ideia é criar um cenário protegido para uma discussão construtiva.

  • Quando a discussão se deteriora, concentrar-se nas emoções em lugar do conteúdo:

Ao observar sua emoção, o objetivo é acalmar a discussão ao invés de provocá-la ainda mais. Há um momento nas discussões no qual mais nada de positivo vai surgir. Com as emoções intensas, a escuta fica bloqueada e o risco de agressão verbal é alto. É a hora de “dar um tempo” ou de colocar em prática a “palavra de segurança”. Metaforicamente, podemos pensar que, quando o uso de energia em uma casa está muito intenso, o disjuntor cai, desliga para evitar um incêndio. Da mesma forma, a utilidade da “palavra de segurança” é para evitar maiores danos à relação. A proposta é que o casal num momento de bem-estar e de fácil comunicação combine qual será a palavra (ou expressão) que sinalizará para ambos qual será o momento de parar uma discussão, para dar um tempo no assunto e voltar depois que a emoção retornou ao seu estado normal. É um ‘cessar-fogo” combinado, para não parecer que um deixou a cena da briga, repentinamente, insultando o outro. É uma forma de autoproteção e salvaguarda da relação, mesmo quando o outro esteja totalmente desregulado. A mensagem a ser passada é: “eu não consigo agir construtivamente nesta situação, quero dar um tempo como proteção a mim e à nossa relação”. É reconhecer que ambos falharam na tentativa de melhorar, e impedir mais prejuízos. Permite, ainda, que a recuperação seja mais rápida.

Por fim, o conflito nos ensina a lidar com nosso pior e com nosso melhor. Aqueles que amamos podem ser atacados ferozmente por nós (e vice-e-versa), numa luta que só fere. É o momento de dar abertura às incompatibilidades e vulnerabilidades, ao invés de evitá-las. Mas os aspectos positivos só podem ocorrer se os danos forem reduzidos. Desta forma, o conflito também pode ser uma oportunidade para lidarmos com nossas emoções mais intensas e trilhar o caminho da reconciliação, aumentando a intimidade e comprometimento com a relação.

 

Referências:

 

Christensen, A., Doss, B. D., & Jacobson, N. S. (2018). Diferenças Reconciliáveis: reconstruindo seu relacionamento ao redescobrir o parceiro que você ama, sem se perder (2a ed.). (M. R. S. W. Lins & M. Rozman, Trads.). Novo Hamburgo, RS: Sinopsys.

Fruzzetti, A. (20015). La Pareja Altamente Conflictiva: guía de terapia dialéctico-conductual para encontrar paz, intimidad y reconocimiento. (A. Colodrón, Trad.).  Bilbao, ES: Desclée de Brouwer

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Sobre o Autor
Mara Lins
CRP 07/05966 Psicóloga. Doutora em Psicologia Clínica (UNISINOS). Mestre em Psicologia Social (PUCRS). Especialista em Terapia de Casal e Família (CEFI). Treinamento em Terapias Comportamentais Contextuais. Treinamento em Terapia Comportamental Integrativa de Casal (Integrative Behavioral Couple Therapy-IBCT) com Andrew Christensen e sua equipe. Professora e Supervisora de cursos de pós-grad... ver mais

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